DIREITO FALIMENTAR E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
INSOLVÊNCIA FÁTICA OU ECONÔMICA
1. O Sentido de se tratar da insolvência. 1.1. Insolvência como requisito para a decretação da quebra. 1.2. Insolvência como código doador de sentido para a execução concursal. 2. Conceito ou noção de insolvência. 2.1. O sentido “etimológico”. 2.2. O vínculo obrigacional. 2.3. Insolvência e Inadimplência. 2.4. Insolvência e Execução Concursal. 3. Reconhecimento legal da insolvência. 3.1. Insolvência econômica e insolvência jurídica. 3.2. Critérios para presunção de insolvência. 3.2.1 Insolvência confessada. 3.2.2 Patrimônio deficitário. 3.2.3 Incapacidade de realizar pagamentos. 3.2.4 Cessação de pagamentos. 3.2.5 Impontualidade. 3.2.6 Enumeração de “atos de falência”. 4. Conclusão.
1. O Sentido de se tratar da insolvência.
Qual o sentido em se falar de insolvência bem no início de um curso de Direito Falimentar? Simples assim: para aqueles que iniciam os estudos a noção de insolvência é importante especialmente sob dois aspectos.
1.1. O estado de insolvência, conforme reconhece a doutrina, é um dos requisitos para a constituição da falência (Campinho, 2020) (Tomazette, 2020) (Júnior, 2019) . E ainda que possa haver quem pense algo diverso (Negrão, 2021) , a presença de um estado de insolvência costuma ser um dos principais pontos da discussão que antecede a decretação da quebra. Mas além de um requisito para que a falência possa ser decretada, a noção de insolvência é o que nos ajuda a entender as razões da existência da execução concursal em geral e da falimentar em especial.
1.2. A insolvência é a causa dos problemas que a execução concursal se propõe a resolver (ou remediar). E como tal, é a partir dela que se podem entender grande parte dos institutos referentes às execuções concursais. A compreensão do direito falimentar, portanto, pressupõe uma noção do que se deve entender por insolvência para fins de direito.
2. Conceito ou noção de insolvência
A busca por um entendimento adequado do que seja a insolvência deve partir de alguns esclarecimentos, a começar pelo dado de que a insolvência é um conceito equívoco, passível de diversos significados que variam segundo o contexto e ramo de conhecimento em que adotado. Mesmo nos limites do conhecimento jurídico, o conceito de insolvência pode oscilar tanto no tempo quanto no interior do próprio sistema. E esse não é um problema que este texto tenha a pretensão de resolver. O que se quer aqui é apresentar uma noção genérica, que possibilite dar sentido à existência da falência e de outras espécies de execução concursal. E para tanto é o caso de iniciarmos pelo que a “insolvência é”. Não pelo que a causa e nem pelos critérios que permitem presumi-la, mas pela ideia que a palavra solvência tem transmitido há milênios. Qual seja.
2.1. A consulta a um bom dicionário latino indica que a palavra solvens (solvente) veiculava a ideia daquilo que “desata” (Souza, 1928), e que o verbo “solvere/solvo” se referia à ação de desunir, dissolver, desatar, resolver”, (Saraiva, 1927) algo não muito distante do sentido que se dá à expressão solvente em se tratando de interações químicas nos dias de hoje. Esta noção do que se deve entender por insolvência, portanto, não é específica do direito, ou de qualquer ramo técnico em especial, mas transmite a ideia correta veiculada pelo termo na generalidade dos contextos.
Mas se solvente é o que desune, desata, desfaz o vínculo, o que exatamente é isso que o solvente desfaz? Ora, em se tratando de direito, o vínculo obrigacional.
2.2. A doutrina apresenta como elementos constitutivos da relação obrigacional os sujeitos (credor e devedor), a prestação e o vínculo (elemento imaterial) jurídico entre as partes (Tartuce, 2021) (Venosa, 2021) (Rizzardo, 2018). E é desse vínculo que se trata quando a expressão solvente (solvens) é utilizada em um contexto de direito obrigacional. Assim, solvente é quem consegue desfazer-se do vínculo em virtude do qual o credor pode exigir do devedor a prestação, e solvência é o estado do devedor que tem meios para desfazer tal vínculo.
Não se questiona se o passivo do devedor é menor que seu ativo ou se os seus bens são avaliados em montante maior que suas dívidas, a ênfase está na possibilidade ou impossibilidade (de romper o vínculo) e não em sua causa.